Grimoaldo Soares, o Narrador
Não foi só nos comentários do futebol - inicialmente pela Rádio Clube, depois em breve passagem pela Marajoara e por cerca de 20 anos na Liberal - que Grimoaldo Soares atuou no microfone esportivo paraense.
Além de locutor comercial eu produzia e apresentava mais 2 programas. Certo dia o bom amigo e excelente profissional, Grimoaldo Soares, que, no rádio, atuava em várias áreas, comentou comigo a idéia que tivera. Palavras do Grima:
Ainda na PRC-5 ele foi repórter-de-campo e narrador, sendo o substituto imediato de Edyr Proença.
O anúncio que publico é do início dos anos 1960 quando a emissora era chamada de o Rádio Clubee não a Rádio Clube.Faziadobradinha com o extinto jornal Folha do Norte, o mais importante e de maior circulação no Norte durante o longo periodo de sua existencia que se exauriu em princípios de 1973. O vendedor de jornais era chamado de folheiro, tamanha era a força do jornal de Paulo Maranhão.
Um piano ao cair da tarde
Além de locutor comercial eu produzia e apresentava mais 2 programas. Certo dia o bom amigo e excelente profissional, Grimoaldo Soares, que, no rádio, atuava em várias áreas, comentou comigo a idéia que tivera. Palavras do Grima:
"Simões, eu acho que a rádio está
precisando de um programa que cubra melhor o horário que vai da tua crônica das
dezoito horas até o começo da "Voz do Brasil", às 19 horas. Imaginei
algo como um musical bem romântico."
No Maracanã, Eriberto Pinto, Grimoaldo Soares ( de chapéu), Haroldo Pinheiro, Edyr Poença ( de óculos), e o Técnico Mucuin em 1954 |
Nem preciso dizer, mas direi, que
Grimoaldo, assim como eu, era muito romântico, também não sabia viver sem amor.
Falar de amor era com ele mesmo. Sabia que o programa teria tudo para dar
certo, pois a concorrência não tinha um programa que atraísse muita audiência
naquele horário.
Mas, e eu? Será que ele estava apenas
trocando idéia comigo ou pretendendo me fazer um convite? A seguir ele
respondeu à minha ansiedade: "Mano, pensei em te chamar para seres o
apresentador do programa. O que achas?"
O esquema era muito simples: um trio que
valorizaria músicas românticas e entre elas eu iria lendo alguns textos,
divagações que falassem dos sentimentos humanos, especialmente do amor. O
próprio Grimoaldo me apresentou alguns dos textos que já escrevera. Gostei e
partimos para a realização do programa. A direção da rádio aprovou fácil a idéia
e o patrocínio também surgiu rápido. Tudo pronto.
Numa linda tarde de primavera eu me
dirigia, de ônibus, ao estúdio antigo, com auditório, no bairro do Jurunas,
onde ficavam os transmissores da Rádio Clube do Pará. A distância de minha casa
era grande mas a alegria da escolha do meu nome pelo Grimoaldo compensava tudo.
Às 18 horas eu li a minha habitual crônica e logo depois entrou no ar, pela
primeira vez: "Um piano ao cair da tarde."
O trio era formado pelo Grimoaldo ao
piano, um integrante da Aeronáutica, amigo do Grima, no contrabaixo e, na
bateria, aquele que mais tarde viria a ser reconhecido como um dos melhores, se
não o melhor do gênero, em todo o Brasil: "Papão". A cada duas
músicas que eles executavam eu entrava com a narrativa pré escrita pelo Grima.
Páginas musicais bem românticas,
nacionais e internacionais garantiam a audiência no horário do Crepúsculo.
Quanto às narrativas, minha velha "indisciplina" de um improvisador
inveterado, acabaram convencendo o Grimoaldo de que ele não precisava se
preocupar mais em escrever textos. Recebi a "ordem": "Mano
Simões, daqui pra frente pode improvisar à vontade. Este espaço é todo
teu."
Quando a música estava nos seus últimos
acordes, o Grima me dava um sinal e eu começava a falar, a falar e falar, em tom
suave, como quem se declara a um novo amor. Não raras vezes eu incluía poesia
nas narrativas. A recíproca era verdadeira, quando eu sentia que ia parar de
falar dava-lhes um sinal e a música subia aos poucos. Saudades, saudades tantas
daqueles tempos, daqueles amigos, daquele programa.
Era ao vivo, no palco do auditório
antigo, na Aldeia do Rádio, que ficava com as portas fechadas para evitar
ruídos que não cabiam no espírito do programa. Espírito que também, por outro
lado, não caberia na atualidade do rádio praticado pelo Brasil afora, com
certeza. O rádio mudou muito, os tempos mudaram, muitas pessoas também, nem
sempre para melhor, infelizmente.
Grimoaldo cumpriu seu tempo por aqui,
com brilhantismo, e foi chamado para outro plano. Dos outros dois companheiros
nunca mais tive notícias, mas sei que o grande baterista "Papão"
ainda deve estar brilhando, provavelmente no exterior. Quem tiver notícias do
excelente "Papão", por favor mande para mim.
Eu segui o meu rumo, deixando o rádio,
que amava, pelo Banco do Brasil, onde teria uma carreira pela frente e uma
estabilidade então garantida. Não deu para conciliar os dois, infelizmente.
Após me dedicar a outras atividades artísticas e culturais, simultaneamente com
o BB, voltei às letras, pela prosa e pelo verso a partir de 1999.
Hoje, aos 69 anos, continuo procurando
usar bem o meu tempo, até que a vida me cobre o prazo pela validade vencida.
Mas, curiosamente alguns anos depois de
eu deixar o rádio, quando já morava no Rio de Janeiro, costumava namorar, ao final
da tarde, em certos dias, com aquela que viria a ser minha esposa, Zezé, ali no
bairro da Glória, onde ela morava.
Até aí nada de semelhante com aquele meu
momento no rádio paraense. Porém nós gostávamos de ficar conversando, sentados
nos bancos do jardim, ouvindo a Rádio Eldorado, da Globo, já extinta.
Justamente entre as 18 e as 19 horas
acontecia um programa delicioso que, por coincidência, também se chamava...
"Um piano ao cair da tarde". Ele embalou nossos sonhos e foi cúmplice
em nosso amor que perduraria por cerca de 40 anos.
Francisco Simões. (Julho / 2005)
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