Nilza Maria: vida dedicada à arte de interpretar

Aos 88 anos, Nilza ainda está em plena atividade. As radionovelas brasileiras foram ícones de uma época de ouro em que televisão era um negócio de outro planeta. O rádio, sim, era o veículo de comunicação mais popular do país e, ao contrário dos jornais impressos, entretinha as famílias em torno dele. 
O auge desses folhetins radiofônicos aconteceu entre os anos 40 e 50, revelando talentos na dramaturgia, tanto entre os escritores - a exemplo de Dias Gomes, Janete Clair e Mário Lago - quanto entre os atores e atrizes, como Luiz Carlos de Magalhães, Sílvia Cardoso e Maria Leda. Na Belém daqueles anos, o sucesso do rádio era o mesmo do restante do Brasil e as radionovelas mais famosas ganhavam intérpretes locais, pioneiros na arte dramática daqui, quando ainda nem existiam cursos de teatro.
A radionovelas entraram em decadência no final da década de 60, mas uma atriz seguiu em frente e está na ativa até hoje, e o melhor, ostentando o orgulho e a experiência de quem passou por todos canais de interpretação. Nilza Maria, um dos principais nomes das radionovelas no Pará, atuou na então recente televisão (TV Marajoara), descobriu o cinema e se apaixonou pelo teatro. Foi aluna da segunda turma da Escola de Teatro da Universidade Federal do Pará, fundada em 1963 por artistas e intelectuais como Maria Sylvia e Benedito Nunes.

Teatro em casa

Tanta inclinação para os palcos só poderia mesmo ter vindo do berço. O pai de Nilza, o funcionário público Olímpio Feitosa, não era exatamente um ator, mas um admirador do teatro e, sobretudo, do cinema. A menina Nilza era sua companheira nas andanças dedicadas à sétima arte. “Nós também adorávamos apreciar as apresentações de teatro de rua, os pássaros juninos. Em casa, era comum brincarmos de teatro com os familiares e amigos. Tudo isso era muito divertido”, recorda Nilza Maria.
A atriz cresceu, mas aquelas lembranças permaneceram. Com cerca de 30 anos e já trabalhando como contadora da antiga Sinap, o amigo Milton Trindade lhe avisou sobre uma seleção para atrizes de radionovelas para uma estação, a Rádio Marajoara. Nilza e mais duas amigas resolveram participar, mas encararam tudo como uma brincadeira e não tinham ideia do quanto aquilo, no futuro, se transformaria em algo sério. Nilza passou na seleção juntamente com as amigas e surpreendeu a todos ganhando, logo de primeira, o papel principal da primeira radionovela da emissora: “Denise”, dirigida por Torres Filho.
O folhetim foi ao ar em fevereiro de 1954, durante a inauguração da Rádio Marajora, emissora da Tupi. Na primeira semana de atuação, a atriz iniciante foi logo premiada com o troféu “Sete Dias de Destaque”, na categoria Melhor Atriz.

Rádio Marajoara

Na Rádio Marajoara, Nilza também participou de peças encenadas ao vivo e com plateia lotada, além programas infantis e de humor. Ao seu lado, destacaram-se outros nomes importantes como Daniel Carvalho, Iracema Oliveira, Mendara Mariani e Tacimar Cantuária. As duas últimas, em 2000, contracenaram e compuseram com ela o trio das doces e misteriosas personagens do curta-metragem Mulheres Choradeiras (2000), de Jorane Castro. No rádio, ela também chegou a contracenar com o ator, diretor, dramaturgo, poeta, escritor, músico, atleta e pensador Mário Lago, que fez o papel de seu pai em uma das várias novelas semanais que protagonizou.
Enquanto fazia sucesso no rádio, surgiu a oportunidade de experimentar algo novo e que ela já admirava ao lado do pai cinéfilo. Convidada pelo cineatra Líbero Luxardo, participou de duas produções dele: Um Dia Qualquer (1962) e Um Diamante e Cinco Balas (1968). Mas isso era só o começo. Atriz de cinema até hoje, a lista das produções, muitas de sucesso nacional, das quais participou é extensa.
Logo que ingressou no curso de três anos para formação de ator, na Escola de Teatro do UFPA, no início da década de 60, Nilza Maria fez trabalhos importantes e que marcaram a história do teatro paraense. A peça “Os Fuzis da Senhora Carrar”, um clássico da dramaturgia mundial escrita por Bertold Brecht, foi encenada em Belém nos idos de 1960, em plena ditadura militar. Nilza, no papel principal, mostrava as dores sofridas pela mãe de dois revolucionários perseguidos pela ditadura espanhola de Francisco Franco. Um espetáculo assim parecia subversivo e foi proibido na Espanha, porém passou ileso pelo crivo da censura brasileira.
Nilza Maria entrou para o Grupo Experiência, do qual faz parte até hoje do elenco de uma das peças de maior sucesso do Estado: Verde Ver-o-Peso, que em 2010 completa 27 anos em cartaz. Também participa do Grupo Cuíra, no qual já encenou montagens como Hamlet e Toda Minha Vida por Ti, dirigida pelo também paraense Cacá Carvalho.
Aos 88 anos e sete filhos adotivos, Nilza Maria é incansável. Diz que, ao trabalhar e experimentar a arte da interpretação no rádio, televisão, cinema e no teatro, aprendeu todas as técnicas que um artista precisa para ser completo. Nessa profissão, ela diz que nunca procurou ganhar dinheiro, mas apenas obter a realização de um sonho.

Por que se orgulhar?

Nilza Maria é o que se pode chamar de uma artista completa. Já esteve, e ainda está, em todos os palcos onde se é possível interpretar. Foi uma das atrizes pioneiras nas radionovelas, telenovelas, no teatro e no cinema no Pará. Como ainda deverá atuar por muitos anos, muito ainda dará de orgulho aos paraenses, fãs fiéis de seu amor pela arte.


Fonte: Diário do Pará - 29;04;2010

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